sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Sapatos de boneca.


Já estava na hora de tirar os grampos do cabelo. Vesti minha saia de corações pretos, coloquei meu colar de pérolas, uma fita na cabeça e um sorriso triste nos lábios. Não que desejasse demonstrar um sorriso triste, mas tinha que esconder (ou pelo menos tentar esconder) alguma coisa e, bem, não sei disfarçar a tristeza dos olhos.
Andei com passos lentos pelas calçadas, o som que produziam abafava o turbilhão de pensamentos que ensurdecia minha mente naquele silêncio insuportável da noite. Os olhos? Sempre marejados.
Quartas feiras à noite me faziam um pequeno mal, mas agora não fariam mais: chegara a hora de decidir por uma eterna esperança ou uma completa indiferença.
Parei no banco certo e o ponteiro maior do relógio chegou ao quatro.
Dez e vinte. Quarta feira. Noite escura e quente. Estaria tudo certo, se não fosse pela solidão. Não que eu não soubesse que ele não estaria lá, mas também não sabia que não estaria. No fundo só havia ido até lá para acabar de vez com aquela esperança que me fazia feliz em platonismo.
As lágrimas finalmente escorreram dos meu olhos, borraram meu meu rímel e o lápis preto. O suor frio que me percorreu durante o um minuto de espera cessou por completo junto com o meu sorriso: agora os lábios com batom vermelho eram apenas sérios.
A indiferença estava na linha da vitória, ela venceria, mas não esperava pela minha virada repentina. Uma virada que fez mudar o curso e o futuro e me faz hoje possuir uma opinião Naturalista do mundo escondida ao meio de ilusões Românticas. Porque nessa virada súbita me vi refletida no vidro de uma loja de sapatos.
Ah, como eu estava linda. A pele como porcelana contrastava com a noite, os lábios vermelhos combinavam com os olhos borrados, as lágrima refletiam as pérolas no pescoço e o cabelo cacheado escorria pelos ombros num movimento constate. Via tudo refletido naqueles sapatos à venda: os diálogos, os sorrisos. Via as palavras escritas nas cartas naquelas tabelas de preço, via a ousadia nas botas de cano alto, a sutileza nas sapatilhas caras, a voz no Scarpin marrom. Tudo aquilo visava à indiferença e sua vitória. Vi o mundo girar em torno de sentimentos e sapatos; eu girava com eles enquanto cedia ao fim do meu mal de quartas feiras.. até que meus olhos focalizaram em algo daquele belo reflexo e eu precisei disso para chegar ao fim daquela noite.
Porque a indiferença estava comemorando a sua vitória cedo demais, afinal não sabia que eu era imprevisível e muito menos que a esperança me conhecia o suficiente para chegar ao ponto de se estabelecer num detalhe de um reflexo de uma loja de sapatos.

É, a indiferença teria vencido se não fosse pelos meus pés calçando aquele par de sapatos de boneca.


2 comentários:

  1. brindarei.

    mas eu não entendi a metáfora dos sapatos de boneca. =x
    por que ele fez com que a esperança ganhasse força?

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  2. lindo, lindo, lindo Ariela
    nao sei mais o que dizer

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Brindará também o surreal?